Preparamos uma série de entrevistas com profissionais, autores e críticos da área literária.

Nossa primeira entrevistada é a coordenadora editorial Luciana Paixão.

 

Por que as editoras apostam tanto em livros internacionais?

Essa é realidade do mercado brasileiro, as editoras apostam muito mais em títulos estrangeiros do que em autores nacionais. Na área de não ficção há uma quantidade “respeitável” de títulos nacionais, mas romances literários, contos e poesia brasileira são a minoria nas prateleiras de nossas livrarias e quase uma raridade nas listas de mais vendidos. Deveríamos tentar equilibrar essa disparidade, seja bolando estratégias comerciais mais agressivas por parte das editoras seja pensando em políticas públicas de incentivo a publicação de ficção adulta nacional.

Com a facilidade que a internet nos proporciona, manter segredo hoje é difícil. Como segurar um lançamento em segredo?

As estratégias hoje estão muito mais voltadas para a divulgação em massa do que para o sigilo dos lançamentos. Por meio de suas assessorias de imprensa e redes sociais, as editoras divulgam seus livros antes mesmo dos originais existirem: na assinatura do contrato com determinado autor ou na aquisição de um título estrangeiro muito disputado.
O E-book ainda está engatinhando no Brasil. Como vê esse futuro digital e impresso?

Vejo o crescimento do livro digital com grande entusiasmo, acho que é mais uma alternativa que pode e deve ser explorada pelas editoras. Claro que o livro não vai desaparecer mas acredito sim que, a médio/longo prazo, as vendas de impressos vão sofrer algum impacto com a opção dos e-books. Uma matéria recente do NYT apresentou um gráfico mostrando que a receita de e-books das editoras americanas e britânicas cresce a cada ano, com uma projeção de ultrapassar a receita de impressos em 2018. Aqui no Brasil as pessoas parecem mais resistentes mas, aos poucos, observa-se que estão descobrindo as novas possibilidades de leitura com os tablets, e-readers, smartphones.  Ao experimentar essas novas plataformas, o leitor “descobre” a facilidade de manusear e a maravilha de carregar uma biblioteca para qualquer canto.

O papel do Editor, entre outros, é definir a linha editorial da editora.  As apostas podem falhar ou não. Como projetar o que será tendência?

Como em qualquer outra área, não existe uma fórmula de sucesso, acredito mais em feeling, networking e bom senso. As grandes editoras possuem scouts, que são olheiros contratados para observar os mercados americano e europeu e apontar as tendências. Relatórios são enviados com informações preciosas sobre títulos que ainda estão sendo contratados pelos grandes grupos editoriais, investimentos em marketing que podem apontar a expectativa em cima de determinado título, tendências  comerciais etc. O networking  com agentes literários, editores estrangeiros e autores também é fundamental.

Muitas vezes percebo que as pessoas têm vontade de publicar um livro, mas ainda não tem a maturidade necessária para escrever. Qual o papel do editor nesse momento?

Atualmente, com as plataformas de publicação, qualquer pessoa pode ser um potencial autor. Para quem nunca publicou, um caminho que pode dar resultado é a criação de blogs para expor os próprios textos ao julgo dos internautas. O número de visualizações e os comentários dos internautas podem ser ótimos termômetros críticos. Além disso, blogs são sempre uma vitrine para os editores, diversos autores foram “descobertos” dessa maneira.

O que percebe para o cenário literário em 2015?

Acredito que as editoras vão procurar diversificar mais seus lançamentos, não apostar todas as suas fichas em apenas um segmento. Observa-se um crescimento latente em áreas como religiosos (católicos, evangélicos, espíritas) e young adult (fantasia, distopias, thrillers).

Harry Potter foi negado 12 vezes antes de ser publicado. O atual sucesso pode ser definido pelo momento em que foi lançado ou por uma boa campanha de marketing?

Desconheço que Harry Potter tenha sido negado 12 vezes antes de ser publicado, mas certamente não era uma grande aposta quando foi lançado pela Bloomsbury ou mesmo quando seus direitos foram adquiridos pela Rocco no Brasil. O mérito dos editores que contrataram o título foi reconhecer uma boa história e publicá-la, mas dificilmente sabiam que viraria um best-seller de gigantescas proporções. O sucesso da série é uma incógnita porque se deu no boca a boca, as pessoas simplesmente foram lendo, gostando e pedindo mais, a ponto de transformar a obra em um dos maiores fenômenos editoriais de todos os tempos. A história sem dúvida é bem escrita, mas ninguém imaginava que se transformaria em um sucesso absoluto.

Consegue ler um livro sem o olhar de editorial?

Mesmo nas minhas leituras pessoais, estou sempre com um lápis, sublinhando frases e parágrafos inteiros, fazendo observações nas margens, corrigindo eventuais equívocos da edição.  Ao ler para os meus filhos, gosto de observar suas reações, querendo saber o que entenderam da história, o que mudariam.

Um recado para os leitores iniciantes.

Assim como amar, ler é um verbo que não se conjuga no imperativo.

 

Luciana Paixão cursou Relações Internacionais na PUC-SP e Letras na USP. É atualmente coordenadora editorial da Editora Planeta do Brasil. Com experiência na aquisição de títulos e na supervisão das etapas de produção editorial, trabalhou nos Estúdios Mauricio de Souza, Saraiva, Larousse e Prumo. Entre os diversos trabalhos realizados, estão a seleção de textos para a coletânea Caio 3D, de Caio Fernando Abreu, lançado pela Agir em 2005, e a edição da antologia de contos Rock Book, organizada por Ivan Hegen e lançada em 2011 pela Prumo.